Finalmente escapamos do ano passado. Ele, uma estrada sinuosa de chão batido na descida de um precipício. Nós, um treminhão cargueiro desses que se vê cheio de cana nos caminhos da Zona da mata. Cai-não-cai, atravessamos os buracos dos dias, morremos de medo nas curvas do tempo e enfim sobrevivemos ladeira abaixo nesses doze meses sombrios.
Uma breve retrospectiva começaria, como todo ano, no Carnaval, com a vaga notícia de um problema longínquo talvez se aproximando de nós. A Páscoa já nós alcançaria de portas fechadas, trancados em casa. Milhares de mães e filhos faltando no dia das mães. São João sem fogueira nem gente dançando a quadrilha, sem sanfona nem forró. Chegada a primavera, resolvemos todos sair junto com o sol em busca das flores e o tempo fechou novamente. Humanidade remota, aglomerada em torno da indiferença pela tragédia em curso. Perdas e mais perdas. Assim passamos pelo Natal e chegamos ao Ano-novo, ansiosos pelo fim desse caminho sinuoso que foi o ano de 2020.
O ano acabou, é verdade, e aos poucos se aproxima o ponto de onde, vacinados, cada um retomará o seu destino. Mas ainda falta um bocadinho de chão para terminar a estrada da pandemia. Exaustos, parece que estamos como quem vem chegando de viagem e vai logo tirando o cinto de segurança antes mesmo de entrar na rua de casa. Atenção, curvas ainda perigosas.
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