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domingo, 15 de agosto de 2021

RITA NA LUTA - A briga do colchão



 Foi desse jeito, mesmo. O abençoado não reconheceu a própria casa, podre de bêbado. Parou na frente da cadeira de balanço de Cicinha, cambaleando, perguntando o que é que ela estava fazendo na calçada dele; a boca troncha, sem conseguir nem falar direito. Cicinha nem se deu ao trabalho de responder nada, somente apontou a direção e continuou se balançando. Parecendo um cachorro perdido, ele ainda olhou para todos os lados, sem saber nem onde estava. Bem na hora que o menino de Suzana veio passando, teve pena, pegou o bebum pela mão e voltou duas casas com ele.

Rita escutava essa conversa no banco da frente das duas mulheres, cabeça baixa, fingindo ler o panfleto de uma empresa de dedetização que recebera antes de entrar no ônibus. Aliás, sua casa estava mesmo precisada, infestada daquelas baratas pequeninas andando pelas suas panelas. Resolveria o problema com veneno de feira, mesmo, que era bom e barato, porque não tinha dinheiro para empresa de dedetização. Guardaria a propaganda para a patroa, que casa de gente rica os bichos gostam também, tem até mais comida espalhada pelos cantos. Melhor que pensar nas baratas, as suas ou as de D. Laura, com certeza era se inteirar daquela fofoca que lhe chegava sem esforço aos ouvidos.

Quando eu vim chegando do trabalho, Cicinha não esperou nem o boa noite: Osvaldo passou agorinha, cheio das cachaças! Apois eu entrei voando em casa, com óóódio. Peguei ele roncando de barriga para cima no meu colchão novo, aquela catinga de suor e bebida, não sabe? Meu medo é ele mijar ou vomitar no meu colchão, quando ele fica assim. Tanta luta para comprar esse colchão, mulher... A gente trabalha o dia todinho, só quer um canto pra dormir direito e no outro dia levantar boa para o trabalho de novo. O colchão que eu tinha antes, só você vendo, eu acordava parecendo que tinha levado uma surra, todo esburacado. Já era muito velho quando ganhei da minha patroa, sendo que ainda passei três anos com ele, até descobrir um ninho de rato dentro de um buraco perto do pé da cama. Por isso tenho cuidado com esse colchão novo, só deito tomada banho, não deixo ninguém comer nem beber nada na cama, para não esculhambar. 

Osvaldo diz que eu gosto mais do colchão do que dele. Vai ver que é verdade e, pra descontar, ele veio deitar todo fedido no meu lençol bem cheirosinho… Mas também, nem tive pena: forrei um lençolzinho e empurrei ele pro chão, nem acordou, de tão melado. Tá sem falar comigo já tem 3 dias. Eu já tô querendo é terminar com ele, mesmo, porque agora só quer viver em bar, nem faz mais nada comigo. Mas eu vou pra onde? Esse colchão é grande demais, não cabe lá na cama que tem na casa de mainha. Tô juntando, ainda, pra comprar uma cama bem espaçosa para o meu colchão, aí eu saio da casa dele.


Foto: https://www.universal.org/post/sono-tranquilo/

4 comentários:

  1. Kkkkk merece ser trocado pelo colchão.Triste ela ter que esperar juntar um dinheirinho pra se livrar dessa vida besta.

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  2. Coitada da Ritinha! Tomara que já tenha conseguido comprar a cama e ter levado para casa da mainha.

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  3. Maravilhoso!
    Nossa, realmente um bom colchão faz toda a diferença na noite de uma grande trabalhadora.
    É isso, aí Rita siga empurrando o Osvaldo do colchão até juntar o seu dinheirinho.
    Olha, tem pessoas que dizem: “O crime não compensa”, mas aos meu olhos sair de casa e não poder levar o colchão por não ter espaço… Ah, esse crime de ficar só mais um pouquinho compensa e como compensa.

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